terça-feira, 17 de março de 2009

"DO CLAUSTRO" (drama)

as atrizes Débora Aoni (esq.) e Carolina Mesquita (dir.) em "Do Claustro"

DO CLAUSTRO (trecho)

Sinopse: Irmã Mariana está enclausurada, às portas da loucura, e precisa da ajuda de Irmã Cecília, em quem confia, para salvar a vida do homem por quem está apaixonada - um poeta e advogado ameaçado de degredo para a África.
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Ação: se passa numa das celas do Convento de Santa Clara do Desterro da Bahia
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Época: final do século XVII, em 1692.
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Local: Salvador, Bahia.
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Personagens:
IRMÃ MARIANA
IRMÃ CECÍLIA
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cartaz de "Do Claustro", 2008
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"Do Claustro" foi apresentada pela primeira vez no dia 17 de janeiro de 2008, no Espaço dos Satyros 1, em São Paulo, sob a direção e iluminação de Eduardo Sofiati, com assistência de direção de Vanessa Morelli, preparação de elenco de Fernanda Levy, trilha sonora original de Gerson Grünblatt, figurinos de Ray Lopes, cenotécnica de Nilton Ruiz, consultoria histórica de Laís Viena de Souza, fotos de cena de Eduardo Sofiati e André Stefano, assessoria de Imprensa de Amália Pereira. Produção de Ruy Jobim Neto para a Cia. Mestremundo de Histórias (da Cooperativa Paulista de Teatro). A peça cumpriu temporada em São Paulo, esteve no Festival de Curitiba 2008 e em abril, no Rio de Janeiro, esteve na sede da Cia. de Teatro Contemporâneo, com a seguinte composição de elenco:
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IRMÃ MARIANA..............Débora Aoni
IRMÃ CECÍLIA.....................Carolina Mesquita
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"Do Claustro" está registrada na Biblioteca Nacional sob No. 440010 (2008)
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vídeos (de Carlos Jansson, Festival de Curitiba, 2008) e fotos (de André Stefano) para a peça "Do Claustro". neste link.
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Mais informações sobre "Do Claustro" nos sites: Folha On Line, Bigorna, G.Online, HQ Maniacs, Portal SulMix, Jornal Spiner (crítica de Nanda Rovere)
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CENA 2

(as duas clarissas já se encontram em cena, enquanto a luz abre em resistência)

CECÍLIA

Vosmecê sequer tocou no pão e na água.

MARIANA

Não é possível que não haja correspondência alguma do Dr. Gonçalo. Não é possível.

CECÍLIA

Mas isso não é motivo.

MARIANA

É motivo suficiente! (tempo) Perdão. Peço que me perdoe, Irmã Cecília. Eu tenho estado um tanto quanto fora de mim. Mas eu prometo que com muita oração e com muita alegria na alma, tudo vai se encaminhar da melhor forma possível.

CECÍLIA

Por certo que vai. E agora eu peço, por amor do Cristo, que vosmecê se alimente um pouco, ao menos um pouco.

MARIANA

Irmã Cecília! Houve alguma vez em tua vida em que vosmecê precisou fazer alguma coisa, em virtude de como se encontrava em determinado momento?

CECÍLIA


Como assim?

MARIANA

Vosmecê sabe que eu estou morrendo.

CECÍLIA

Eu não sei de nada. E vosmecê, por favor, não me repita mais uma sandice dessas! Saiba que tudo o que eu fizer será para que vosmecê não se enfraqueça. Afinal de contas, pelo que eu saiba, nenhuma de nós aqui tem qualidades suficientes para atingir a santidade através de martírio.


MARIANA

Não a santidade, mas a realidade. Se eu te disser que é apenas em vosmecê que eu deposito toda a minha confiança, e que diante de tudo o que tem acontecido, eu pedir a vosmecê dois favores imensos, eu agradeceria eternamente se puder ser atendida. É algo sério. Não tenciono brincar com isso.

CECÍLIA

Não foi justamente nossa Santa Mãe Clara quem nos ensinou a ajudar as irmãs que estivessem descobertas e necessitadas?

MARIANA

Sim.

CECÍLIA

Façamos uma troca. Vosmecê come do pão e bebe da água que eu lhe trouxe e eu te serei toda ouvidos para esses teus dois pedidos. (IRMÃ MARIANA se serve e bebe um gole) Pois bem... Quais são eles?

MARIANA

Eu quero me confessar contigo. E depois vosmecê me conceda a extrema unção.

CECÍLIA

Vosmecê disse que não ia brincar com esse tipo de coisa.

MARIANA


Eu não estou brincando.
(...)
......................
(...)
CENA 6

(Sinos.)

MARIANA


Vosmecê não tem que participar do ofício?

CECÍLIA

A reverenda Madre me reservou para que eu estivesse sempre contigo. Eu disse a ela que vosmecê está bastante mal.

MARIANA

Pois não mentiu. Para mim, as quatro paredes desta cela se transfiguram gelidamente no cárcere de Gonçalo.

CECÍLIA

Vosmecê não devia dizer blasfêmias.

MARIANA

Já não basta minha penitência?

CECÍLIA

Eu muito que tenho te trazido pão, água e frutas do nosso pomar, mas vosmecê tem evitado comer. Se tua penitência é esperar pelo teu último suspiro em prol da saída do Dr. Gonçalo da Cadeia Pública, muito te admiro. Tua determinação em te tornar mártir beira as raias da insânia.

MARIANA


Eu já pedi a vosmecê a extrema unção.

CECÍLIA

Insânia. Blasfêmia. Heresia.

MARIANA

Irmã Cecília, vosmecê sabia que o significado de teu nome está associado à cegueira?

CECÍLIA

E no entanto, eu enxergo com muito maior distância do que vosmecê, Irmã Mariana, cujo pensamento está única e exclusivamente voltado para o aqui e o agora. E nada mais.

MARIANA

Cecília, eu preciso tirar Gonçalo da prisão, e só vosmecê pode me ajudar!

CECÍLIA

Não vejo lógica pelo fato de que vosmecê alega estar “apaixonada” pelo Dr. Gonçalo, uma vez que nem sabe sequer se ele continua vivo ou, sabe-se lá, se foi desterrado para a África.

MARIANA

O que vosmecê está sabendo? Por que vosmecê não me traz informações sobre ele? Por que vosmecê não me traz mais cartas? Por que me condena desta forma?

CECÍLIA

Eu não trago cartas por que não há. Simplesmente não há. Não há.

MARIANA

E não existe “alegação” alguma em eu dizer que estou apaixonada por ele, pois é a plena verdade. E ele também está apaixonado.

CECÍLIA

Delírio teu. Delírio de juventude, ilusão pura. Este homem é conhecido nas ruas da Cidade. Este homem tem toda uma vida lá fora!

MARIANA

Este homem tem toda uma vida aqui dentro de mim!

CECÍLIA

Eu vou chamar a Madre Superiora!

MARIANA


Não! Eu preciso apenas que vosmecê me escute em segredo de confissão!

CECÍLIA

Eu já ouvi o suficiente!

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contato com o autor: jobimneto.ruy@gmail.com
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